A SANHA DO TORTURADOR

Por Camila Alam

Ganha as telas brasileiras no próximo dia 27 o filme que maior comoção causa entre os espectadores de documentários sobre a história recente do País. Vencedor da 14ª edição do festival É Tudo Verdade, Cidadão Boilesen, de Chaim Litewski, gira em torno da participação de grandes empresários no financiamento das ações do Exército durante a ditadura. O principal deles, e figura central deste longa, foi Henning Albert Boilesen, dinamarquês naturalizado brasileiro, presidente da Ultragaz na década de 1960.

No longa, o diretor Litewski aborda o tema de maneira interessante, com trilha sonora animada e edição moderna. Resultado de pesquisa extensa, a trajetória de Boilesen é contada desde a infância, com a ajuda de arquivos escolares municipais, reveladores, desde cedo, de uma personalidade dúbia do protagonista.
Conhecido por amigos como pessoa bem-humorada, um líder nato, Boilesen por vezes era cruel, frio. Chegou ao Brasil pobre, mas rapidamente, e por méritos próprios, tornou-se presidente de uma das maiores companhias da época. Frequentava colunas sociais, adorava bailes, caipirinhas e mulatas. Anticomunista, teria sido o maior entusiasta da “caixinha” entre os empresários brasileiros – sobretudo paulistanos – para financiar a Operação Bandeirante, criada pelo Exército. Boilesen teria participado pessoalmente de sessões de tortura, sendo responsável por trazer ao País um aparelho de choques elétricos mais moderno, tempos depois conhecido como Pianola Boilesen.

Por meio de depoimentos diferentes, Cidadão Boilesen traça um perfil do empresário até a sua morte, em 1971, quando fora encurralado e executado por militantes da ANL e MRT em uma rua próxima à avenida Paulista, em São Paulo. Carlos Eugênio Paz, líder da ação e um dos poucos sobreviventes do grupo, fala com detalhes sobre o dia da morte do empresário. O depoimento de ex-militares, políticos, religiosos, guerrilheiros, amigos e parentes estão mesclados a cenas de ficção de longas como Pra Frente Brasil, de Roberto Farias, e Lamarca, de Sérgio Rezende. A narrativa por vezes deixa escapar sutilmente um quê de ironia, resultado da fala descuidada de alguns entrevistados.



Camila Alam é colunista da revista Carta Capital

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