Sem gabarito: estatística para pontuar o ENEM

Por Glória Tupinambás

Sabe aquela mania de terminar o vestibular e sair correndo para conferir o gabarito? Pois é, esse hábito vai cair de moda com a nova versão do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). No teste, que deve substituir os tradicionais processos seletivos nas universidades federais do Brasil, não será mais possível conferir o resultado por conta própria. Quem dará a nota final é o Ministério da Educação (MEC), que vai usar um superprograma de estatística, chamado Teoria da Resposta ao Item (TRI), para calcular a pontuação. E nem adianta queimar neurônios e fosfato para tentar decifrar essa fórmula, pois ela não é nada simples. Aliás, é tão complexa que um aluno que acertar menos questões pode ter mais pontos que outro estudante que tiver maior número de acertos.

A explicação desse modelo estatístico passa, primeiramente, por um sistema de pesos das questões. Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep/MEC), responsável pela elaboração e correção do Enem, as perguntas serão agrupadas, de acordo com o grau de dificuldade, em três conjuntos – fáceis, médias e difíceis. E as questões mais complicadas valerão mais pontos que as demais. Numa comparação, o Enem vai se parecer mais com um jogo de basquete do que com uma partida de futebol. “No futebol, vence quem fizer mais gols. Já no basquete, as cestas valem pontos diferentes. Há arremessos de três ou dois pontos, dependendo da distância do jogador à tabela”, afirma o matemático Jayme Queiroz de Mello, doutorando em estudos estatísticos.

Mas a complexidade da TRI não se resume à escala de pesos. De acordo com o Inep/MEC, o modelo estatístico permite calcular o comportamento de cada questão. Ou seja, é possível supor quando o aluno está chutando a resposta de uma determinada pergunta, de acordo com o que ele assinalou em outra questão. É uma dinâmica de erros e acertos que possibilita traçar o perfil de quem faz a prova. “Se o aluno vai bem nas perguntas mais difíceis, é porque ele, necessariamente, acertou muitas questões fáceis. Caso contrário, o sistema entende que ele chutou a resposta difícil. A explicação para isso é simples: não é possível alguém errar uma operação básica de matemática e, mesmo assim, solucionar uma questão de física, que depende de uma fórmula com muitas contas”, acrescenta Jayme.

Segundo o Inep, a aplicação da Teoria da Resposta ao Item no Enem é uma forma de permitir a comparação das notas do estudante ao longo do tempo. O programa de estatística, criado na década de 1970, já é usado pelo Ministério da Educação em outros exames, como a Prova Brasil e o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb). O TRI também é usado pela maioria das universidades dos Estados Unidos, que selecionam alunos pelo teste conhecido como SAT. E, assim como nesses exames, o Enem não vai mais ter uma nota de 0 a 100. O resultado agora será um índice de proficiência dividido por áreas. Ou seja, o estudante terá cinco pontuações – de linguagens, de matemática, de ciências da natureza, de ciências humanas e de redação. O resultado será divulgado a partir da segunda quinzena de janeiro de 2010, quando os participantes do Enem vão receber, em casa, um boletim individual com as notas.

Em meio a esse turbilhão de novidades envolvendo o Enem, alunos de colégios e cursinhos pré-vestibulares não escondem a ansiedade e o medo. “Já estávamos inseguros com as mudanças, mas essa notícia de não poder mais conferir o gabarito vai desorientar a galera. É ruim fazer uma prova sem conhecer bem o estilo das questões e o nível de cobrança”, lamenta a candidata a uma vaga de medicina, Ana Luíza Azevedo, de 17 anos. O colega dela, João Henrique Moreira, também de 17, teme o cansaço durante o teste. “São 180 questões em dois dias de prova. Além disso, o Enem tem textos grandes nas questões, por isso acredito que vamos enfrentar uma maratona”, diz ele, que vai concorrer ao curso de jornalismo.

Fonte: Jornal Estado de Minas - 09/06/2009

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