A Cura da Miopia Midiática

Globo e você, nada a ver


Por Cléber Sérgio de Seixas

A edição de número 639 da Revista Época é quase toda ela um libelo contra a pessoa de Dilma Rousseff e aquilo que sua candidatura representa. Quem acha que a campanha contra a escolhida de Lula se encerra na capa da revista e nas 14 páginas da tendenciosa matéria de capa se enganou.

Na página 50 ainda encontramos um tal Guilherme Fiúza a desancar Lula e seu governo, e a rebater o mantra da suposta insignificância de Dilma. No início do artigo ele afirma: “Lula não tem culpa do poder político sobre-humano que adquiriu. A culpa é do Brasil”. Depois de algumas considerações, Fiúza continua se arvorando no direito de questionar a escolha do povo brasileiro, conforme deixa claro neste trecho: “Lula era um presidente normal até estourar o mensalão, o maior escândalo de corrupção da história da República. Pela primeira vez, o grupo político de um presidente criava um duto sistemático entre os cofres do Estado e seu partido. O enredo foi descoberto, seus protagonistas denunciados, e o país passou a mão na cabeça de Lula – não apenas preservando-o, mas passando a conferir-lhe taxas históricas de popularidade”.

Perceba o leitor que o nobre jornalista não titubeia ao afirmar que o país, ou seja, os brasileiros, passaram a mão na cabeça de um presidente que estaria envolvido num esquema de corrupção. Além disso, diz com todas as letras que o mensalão é o maior escândalo de corrupção da história republicana. A miopia que vitima o jornalista – e o faz confundir denúncia com condenação, além de não deixá-lo enxergar um outro mensalão (o do DEM) mais patente e mais grave, inclusive motivador do afastamento de um governador até então cotado para ser vice de Serra – foi adquirida pelo contato com meia dúzia de donos de meios de comunicação que dão um tiro no pé ao se levantarem contra aquilo que é o ponto de vista da maioria esmagadora dos brasileiros.

Na última página da referida publicação, Ruth de Aquino, diretora da sucursal da revista no Rio de Janeiro, afirma em seu artigo que o eleitor fanático, contra ou a favor, não é o problema nesta eleição, pois já decidiu e nem precisa ver seu candidato ou sua candidata entrar em campo. Ela questiona, assim, o juízo de milhares de brasileiros que, conforme apontam as últimas pesquisas, darão seu voto de confiança a Dilma como se votassem pela continuidade do que até agora tem sido feito sob a batuta de Lula. A articulista atira-os numa vala comum e os qualifica como fanáticos.

A grande mídia teima em trafegar na contramão da ótica do povo brasileiro. Não percebeu ainda que o que o povo vê são as melhorias substanciais na sua qualidade de vida ocorridas desde o início do primeiro mandato de Lula. Mensalões, dossiês e toda sorte de denúncias não constituem mais um discurso palatável à grande massa, sobretudo depois que esta passou a não mais acreditar piamente no que dizem os oráculos midiáticos. O povo brasileiro aprendeu a ser tão pragmático quanto seu presidente, e está mais preocupado com comida na mesa, com os filhos na faculdade, com o carro na garagem para o passeio do fim de semana, e com outras coisas com as quais nunca sonhara durante os oito anos da gestão FHC.

Portanto, resta uma esperança de cura para os grandes meios de comunicação. Seu tratamento passará obrigatoriamente por um retorno a seu mister original: informar. E informação não pode ser confundida com opinião. Informar significa ler os fatos da forma mais fidedigna possível, sem acrescentar à leitura as idiossincrasias de quem escreve. O restabelecimento da saúde da grande mídia passará também pela cura de um sintoma cuja manifestação a faz arvorar-se em bastião da democracia e a faz confundir liberdade de imprensa e liberdade de empresa. A história recente do Brasil, no entanto, mostra de que lado esteve a grande imprensa e demonstra que seu modus operandi passa ao largo da democracia.

Quando a grande imprensa tiver sido curada de sua miopia, quem sabe o povo deixe de, diariamente, escutá-la sem ouvi-la.

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