A Teologia da Prosperidade



Por Jeferson Malaguti Soares *

O termo TEOLOGIA nos vem do grego e quis significar o estudo da “teoria do divino”, da divindade.  O primeiro a usar o termo foi Platão, para referir-se à compreensão da natureza divina de forma racional. Aristóteles se referiu à teologia como um ramo da filosofia que mais tarde passou a ser denominado metafísica. Pelos séculos a seguir, a teologia teve algumas variantes, como a teologia natural e a sobrenatural, propostas por Santo Agostinho, e ainda a teologia negativa que defendia a incomunicabilidade de um ser divino por meio da linguagem racional (Deus fala por outros meios de comunicação).

A incorporação do termo pelo cristianismo se deu perto do ano 450 de nossa época com o significado do saber cristão sobre tudo que Deus representa. Na tradição cristã (de matriz agostiniana), a teologia é organizada segundo os dados da revelação e da experiência humanas. Esses dados são organizados no que se conhece como teologia dogmática. Dogma também é um termo de origem grega que, inicialmente, significava que o que se pensa é a verdade. Mais tarde passou a designar pontos fundamentais e indiscutíveis de uma crença religiosa. Não se discute a veracidade desses pontos, aceita-se e pronto. São verdades reveladas por Deus, segundo a crença cristã, às quais não cabem questionamentos.

No século passado surgiu a Teologia da Libertação, mais precisamente nos anos 1970, que se constituiu numa corrente cristã de cunho político-social, a qual exigia a opção preferencial pelos pobres, baseada nas ciências humanas e sociais. Os principais expoentes desta teologia no Brasil, atualmente, são Frei Leonardo Boff e Frei Beto. A corrente sofreu dura represália dos papas João Paulo II e Bento XVI, por entenderem que ela teria uma conotação político-partidária com tendência à esquerda, em vista da interpretação dos ensinamentos de Jesus em termos de uma libertação de injustas condições econômicas, políticas e sociais pelas quais passavam os povos do mundo. 

O enfraquecimento da Teologia da Libertação, induzido pelos papas supramencionados, beneficiou significativamente o crescimento de um novo ramo das igrejas protestantes pentecostais que estava surgindo: as igrejas neopentecostais. À proliferação indiscriminada dessas igrejas, cujos “proprietários” visam precipuamente o lucro fácil, cooperavam a isenção absoluta de impostos e o aumento de pobres e necessitados, aumento este decorrente das políticas econômicas neoliberalistas nos países tidos como subdesenvolvidos ou em desenvolvimento. 

Essas igrejas passaram a adotar uma teologia cuja linguagem teológica os remetia a “exigir” de Deus o suprimento de suas necessidades materiais. Estava constituída a Teologia da Prosperidade que, através de uma nova interpretação dos ensinamentos bíblicos, defende que a bênção financeira é o desejo de Deus para os cristãos e que a fé e o discurso positivo, bem como doações para os ministérios cristãos irão sempre aumentar a riqueza material do fiel (Wikipedia). 

Esse “evangelho da prosperidade” tem como um de seus fundamentos o Livro de Malaquias (Wikipedia). Numa interpretação pouco tradicional da Bíblia, a doutrina prega um contrato entre Deus e seus fiéis, qual seja, se os homens cumprirem com suas obrigações Ele irá cumprir suas promessas de segurança e prosperidade. “Eu, o Deus Todo-poderoso, ordeno que tragam todos os seus dízimos aos depósitos do Templo, para que haja bastante comida na minha casa [...] abrirei as janelas do céu e farei cair sobre vós as mais ricas bênçãos [...] suas parreiras darão muitas uvas [...] todos os povos dirão que vocês são felizes, pois vocês vivem numa terra boa e rica.”(Malaquias, cap. 3, versículo 6). 

Daí para exigências cada vez maiores, extrapolando os ensinamentos divinos, as igrejas neopentecostais, alicerçadas na Teologia da Prosperidade, ficam cada vez mais ricas. Novos templos vão surgindo. Investem na mídia através de canais de TV e rádios, jornais e revistas, de tal forma que as igrejas pentecostais tradicionais, como a Assembléia de Deus e a Batista, se vêem compelidas a adotar a mesma teologia para não serem engolidas pelas neopentecostais.

Assim, a riqueza é interpretada, na Teologia da Prosperidade, como uma bênção de Deus, obtida através da lei espiritual da confissão positiva, da visualização e do dízimo. Seria um contrato inviolável entre Deus e a humanidade.

As distorções não demoraram a aparecer. A ênfase no dízimo passou a transpor também para os bens dos fiéis. Eles são instados a entregar para a igreja, automóveis, salários inteiros, casas, poupança, tudo que vá lhes proporcionar um retorno material maior em vida. 

As críticas à maneira como essas igrejas neopentecostais atuam não têm frutificado entre as pessoas mais necessitadas que, cada dia que passa, fazem crescer o número de fiéis nesses templos. De nada tem adiantado a avaliação negativa do modus faciendi dessas igrejas. Elas continuam crescendo, principalmente em países pobres, onde os ricos detêm os benefícios da economia e os pobres arcam com o trabalho mal assalariado. 

Jesus e o jovem rico, é um episódio da vida de Cristo que trata da vida eterna. Ele pode ser encontrado nos três evangelhos: Mateus (19,16-30), Marcos (10,17-31) e Lucas (18, 18-30). É neste episódio que Jesus faz referência a “Quão dificilmente entrarão no reino de Deus os que têm riquezas! Pois mais fácil é passar um camelo pelo fundo de uma agulha, do que entrar um rico no Reino de Deus” (Lucas 18,24-25), uma frase emblemática das riquezas no reino de Deus. Nem essa frase nem a que diz para que não amealhemos riqueza na terra pois maior riqueza está no reino dos céus, nenhuma delas e várias outras citações bíblicas sobre o despojamento de bens terrenos, são citadas em qualquer sermão dos pastores neopentecostais. Afinal, a prosperidade terrena visa riqueza material, enquanto a libertação espiritual nada tem de terrena e muito menos de material.

A expropriação, o abuso e a extorsão são de tamanha magnitude que tornaram milionários alguns “donos” dessas igrejas, ao ponto de serem construídos templos faraônicos para deleite dos fiéis enganados. Enquanto isso, proliferam pequenas “igrejas” em garagens e fundos de quintal, cujos “pastores” embarcam na ilusão de se tornarem tão ricos quanto seus antecessores na sorte grande da exploração pecadora de fiéis incautos.

Quiçá essas igrejas pregassem a Teologia da Prosperidade Moral e Ética.


* Jeferson Malaguti Soares é administrador, consultor de empresas, Secretário de Formação do PCdoB Ribeirão das Neves e colaborador deste blog.

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