A ditadura camuflada


Por Miriam Pacheco da Silva Seixas *


O ano de 2012 nem bem iniciou e apresenta uma série de acontecimentos em nosso país dignos de medalhas forjadas em papel brilhante, mas que, na verdade, merecem uma reflexão sobre o caminho que nossa sociedade tem tomado.

Da grávida falsa com barriga exorbitante a estupro televisionado e veiculado como algo comum, passando pelo caso da tal Luiza que veio do Canadá, fica patente que nossa sociedade passa por um período onde todos os valores e direitos precisam ser urgentemente revistos, em face das futilidades que dominam corações e mentes.

Algo anda em frangalhos em nossa sociedade. Os assuntos banais predominam nos burburinhos, enquanto temas dignos de reflexão passam longe de qualquer discussão coletiva. São poucas as pessoas que se aventuram a falar sobre assuntos mais sérios, e os que se atrevem a tal, sofrem o estigma da reprovação. Deixando de lado os assuntos banais que arrebatam os telejornais com uma importância desmedida, a intenção deste texto é versar sobre o episódio que tem me deixado estarrecida: o caso da favela de Pinheirinho.

Atrevo-me a “bedelhar” nos valores do Poder Judiciário e afirmo que oscilam entre as idiossincrasias do ser humano e a formalidade das leis. Acredito na lei e na justiça, desde que essas não sejam usadas para beneficiar poderosos e massacrar as massas. É preciso que a Justiça seja feita e que as nossas leis se orientem no sentido de amparar os que estão mais vulneráveis às mazelas sociais. Subentende-se que a Justiça foi feita para defender os mais fracos, mas no caso especifico de Pinheirinho vimos exatamente o contrário, a Justiça, uma res publica, sendo usada para defender interesses de particulares.

Pior que o Judiciário andam os governantes da ala centro-direita que, camuflados de pessoas bem intencionadas, arautos da ordem, são na verdade adeptos das balas de borracha, das bombas de gás, das caminhadas permeadas por indignação seletiva (onde estão os manifestantes indignados com as denúncias contidas no livro A Privataria Tucana?); são estes mesmos que aceitam, admitem e participam do processo de privatização dos bens nacionais e sua venda ao mercado estrangeiro, patrocinando, assim, a desvalorização da Nação.

Para estes governantes, o cheiro do povo é desagradável. E um governo como o de Lula trouxe uma “fragrância” incomoda às suas narinas, consideradas insensíveis ao cheiro de suor decorrente de trabalho duro. E o governo Dilma, por declarar ser de continuidade, promove o exalar do mesmo cheiro indesejável. Certa vez, o último dos ditadores do nosso período castrense, o General João Batista Figueiredo, afirmou que preferia o olor equino ao cheiro do povo. Governantes como os responsáveis pelo flagelo do povo de Pinheirinho tem na sua formação uma raiz de inspiração fascista, com resquícios da ditadura militar, especializados em tortura, humilhação e escárnio.

As massas às vezes se interpõem entre os interesses das classes dominantes, tornando-se algo inconveniente e que deve ser expurgado, espoliado e relegado aos rincões da Pátria, aos subúrbios ou para debaixo do tapete, para que o mundo não veja.

O que as massas precisam aprender é não render-se ao pensar dominante. Parafraseando Paulo Freire no livro A Pedagogia do Oprimido, o oprimido acaba adquirindo, introjetando, o discurso do opressor. Os oprimidos, assim, acabam achando que os opressores tem razão. O doutor sempre estaria certo porque tem estudo, detém meios e possui mais grana. No entanto, cabe ao povo mudar esse paradigma e não se deixar levar por um discurso que o oprime.

O caso Pinheirinho é emblemático e pode ser apenas o começo, um mau exemplo que pode ser seguido por governantes a serviço dos poderosos de plantão; uma tragédia que a qualquer momento pode se repetir em outras partes do Brasil, inclusive aqui em Minas Gerais, onde casos semelhantes como os das comunidades Dandara e Zilah Spósito geram inquietação em virtude dos interesses de especuladores imobiliários.

Os ex-moradores de Pinheirinho gritam, agonizam, padecem e cabe ao restante das massas não se calarem diante dos coronéis e dos engravatados que atrás deles se escondem.


* Miriam Pacheco da Silva Seixas é professora, psicopedagoga e mantenedora deste blog.
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