COMBATE AOS FICHAS-SUJAS


Editorial

É muito bem-vinda e merece apoio a iniciativa do presidente recém-eleito da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, de mobilizar todas as seções regionais da entidade para participar da Campanha Nacional de Combate à Corrupção, que a instituição está patrocinando. O primeiro trabalho será a coleta em todos os escaninhos da Justiça brasileira dos processos em tramitação envolvendo denúncias de corrupção e de desvio de recursos públicos. Identificados esses casos e seus protagonistas, o material ficará exposto no site da OAB, de modo a facilitar o acesso gratuito a todo cidadão interessado em saber se quem lhe pede o voto, ou já dirige algum órgão público, está envolvido em casos que o tornem menos recomendável à carreira política. Está cada vez mais claro que separar o joio do trigo terá de ser também papel do eleitor. Mas ele não terá como exercê-lo sem contar com informações fornecidas com a credibilidade de uma entidade livre do engajamento partidário, como é o caso da OAB.

A importância e a urgência dessa campanha tornam-se ainda mais evidentes quando se registram a lentidão e a má vontade com que vem sendo tocado na Câmara dos Deputados o projeto de iniciativa popular conhecido como Ficha Limpa. Organizado pela ONG Movimento Contra a Corrupção Eleitoral (MCCE) e tendo o apoio da Igreja Católica, que mobilizou paróquias em todo o país, principalmente em Minas, o projeto chegou a Brasília em 29 de setembro, sustentado por impressionante 1,5 milhão de assinaturas, número muito superior ao mínimo exigido por lei para garantir a sua aceitação e tramitação pelo Congresso Nacional. Basicamente, o projeto, que recebeu o número 518/009, veda a concessão de registro, pela Justiça Eleitoral, de às candidaturas de políticos condenados em primeira instância por crimes contra a vida ou que atentam contra a administração e patrimônio públicos. Para evitar que adversários políticos movam processos sem justificativa apenas para inviabilizar a campanha do opositor, o projeto somente considera as ações de autoria do Ministério Público.

Mas nem essa cautela, nem o comprovado apoio popular têm conseguido vencer resistências de deputados de praticamente todos os partidos. O ritmo que a Casa tem dado ao projeto é o de passo de tartaruga. Há desculpas mais ou menos fundamentadas, como a do líder do PT na Câmara, deputado Fernando Ferro (PE), que levanta a necessidade de alterar o projeto antes de pô-lo em votação, sob pena de condená-lo à rejeição por ferir o direito de defesa e promover o prejulgamento dos denunciados. A alteração seria no sentido de somente negar o registro aos candidatos que tenham sido condenados em segunda instância. Ele teme que, na primeira, fisicamente mais perto dos envolvidos, os julgamentos sofram forte pressão das disputas eleitorais. A preocupação é razoável. O que não se justifica é engavetar o projeto, criar empecilhos à sua tramitação. Que se façam as modificações necessárias a tornar o projeto mais justo e mais eficaz. Nem mesmo o ano eleitoral pode ser invocado como obstáculo para a discussão e votação do Ficha Limpa, já que é exatamente para fazer efeito sobre as eleições que ele foi concebido e conquistou a simpatia, a adesão e a esperança de tantos eleitores. Frustrá-los será mais um golpe na já abalada confiança da sociedade na representação política.

Fonte: jornal Estado de Minas - 09/02/2010

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