TREM LEVOU AS PESSOAS E DEVE TRAZER O MINÉRIO

Por Paulo Henrique Lobato
Ferrovia não transporta mais passageiros, mas escoa a produção do cerrado
Corinto e Lassance – O alemão Vupes, personagem de Grande Sertão: veredas que vendia de tudo a fazendeiros, acertou em cheio quando disse ao também “estranja” Assis Wababa, um comerciante turco, que Curralinho lucraria bastante com a chegada do trem, conforme trecho no alto desta página, destacado do romance. A chegada da estação ferroviária impulsionou tanto a economia do povoado que o lugarejo se emancipou de Curvelo. Curralinho agora é Corinto.

Os trens de passageiros que rasgaram o cerrado ajudaram a impulsionar a economia, mas, 60 anos depois da viagem que Rosa fez pelo cerrado para escrever o livro, não há mais vagões transportando pessoas pela região. Por outro lado, não há expectativa de que o minério que começa a ser descoberto na região amplie a malha férrea de cargueiros.

A morosidade do poder público em apostar nos caminhos férreos para passageiros é exemplo de como o país precisa avançar em relação à estrutura de transporte. Até porque mais trilhos significam geração de empregos. A maria-fumaça que levou à emancipação de Curralinho, por exemplo, era administrada pela Estrada de Ferro Central do Brasil e garantia muitos empregos. “Havia pelo menos 1 mil funcionários aqui, pois Corinto abrigou importante oficina de trens”, recordou o prefeito local, Nilton Ferreira da Silva.
Um dos moradores que ganharam a vida nos trilhos do ex-povoado de Curralinho é Elias Caetano, de 81 anos. “Fui lenheiro: abastecia a caldeira com madeira. Depois, responsável pelas bagagens. Que saudades!”, suspirou o homem enquanto descansava no banco da praça principal de Corinto, de onde se avista o supermercado Varejão Sertanejo, de Gerson de Almeida. O empresário foi outro que se beneficiou da época do trem de passageiros: “Montei uma venda em 1979. Eu era o único ‘empregado’ de minha loja. Dei duro e, hoje, tenho 51 colaboradores”. Os vagões com adultos e crianças que passavam pela cidade faziam parte do Trem do Sertão, que ia de Belo Horizonte a Monte Azul. Dali, fazia-se baldeação para Salvador.
O ramal passava por Sete Lagoas e foi extinto em 1996. A linha foi tão importante para o cerrado de Minas que Guimarães Rosa o citou no romance por mais de uma vez. Além da conversa entre Vupes e Assis Wababa, a locomotiva foi registrada por Riobaldo, o protagonista, que embarcou no Trem do Sertão com boa vestimenta: “(...) Faz tempo, fui, de trem, lá em Sete Lagoas, para partes de consultar um médico, de nome me indicado. Fui vestido bem, e em carro de primeira, por via das dúvidas, não me sombrearem por jagunço antigo”. O próprio escritor, ao fim da viagem ao lado de Manuelzão e outros vaqueiros, entrou num vagão em Sete Lagoas rumo ao Rio de Janeiro, onde morava.


A Miba, que deve aportar R$3,6 bilhões na extração de minério no Norte, também pode construir uma linha férrea. A empresa pretende construir um ramal da região de Grão Mogol a Catité (BA), onde tem outro projeto mineral. A Vale, por sua vez, pode rasgar um caminho férreo até a malha da FCA, sua controlada. Apenas a título de comparação, estudo feito na década passada estimou que produtores de soja pagavam R$ 0,056 por tonelada transportada em caminhões. No caso de vagões, o preço caía para R$0,016 – 28,5% do custo da viagem pelo asfalto.
Fonte: Jornal Estado de Minas, 29 de março de 2012.
.
Comentários