Imperialismo interplanetário

 Foto da superfície de Marte tirada pela Curiosity (Nasa)

Por Cléber Sérgio de Seixas

Haverá limites para a audácia e o engenho humanos? Até onde irá o homem em sua epopéia rumo ao infinito? Será possível à espécie humana progredir sem destruir o ambiente que a abriga? Caberá a ganância humana apenas neste pequeno asteróide chamado Terra?

Atualmente, há quem se preocupe com o esgotamento dos recursos naturais do planeta, há quem lute por um desenvolvimento em moldes sustentáveis, mas poucos são os que refletem sobre a infinitude do desejo humano.

A recente chegada do robô Curiosity em Marte é mais uma aventura a demonstrar que nossa evolução tecnológica já rompeu os limites do improvável. Desde quando Gagarin afirmou que a Terra era azul até o pouso do veículo-robô no Planeta Vermelho, o universo se tornou menor. Até chegar a Marte, a sonda de aproximadamente uma tonelada viajou cerca 570 milhões de quilômetros, numa missão que se iniciou no dia 26 de novembro de 2011, data do lançamento do foguete Atlas V541, e que custou à NASA a bagatela de 2,5 bilhões de dólares. Uma vez na superfície de Marte, a Curiosity fará análises de solo, bem como enviará à Terra fotografias do relevo marciano.

Na língua de Camões, o nome da mais nova façanha da NASA se traduz como “curiosidade”. Contudo, o sentimento que impulsiona o homem rumo a planetas longínquos pode não ser somente a curiosidade de descobrir se estamos ou não sozinhos no universo. É bem provável que motivações bem menos nobres se encontrem nos bastidores do espetáculo do rompimento de fronteiras planetárias e espaciais.

Sempre houve indivíduos dispostos a enfrentar o desconhecido impulsionados pela busca de riquezas ou pelo afã de tornar seus nomes célebres. Quando Colombo se lançou ao Atlântico, fazia-o tanto em busca da glória e fortuna pessoais, quanto em prol do imperialismo da Coroa Espanhola, este desejoso pelas riquezas que poderia extrair do novo mundo d’além-mar. Outro imperialista travestido de desbravador foi Cecil J. Rhodes, um dos mais famosos capatazes do imperialismo inglês no continente africano. Certa vez afirmou Rhodes:
Sustento que somos a primeira raça no mundo, e quanto mais do mundo habitarmos, tanto melhor será para a raça humana. ...Se houver um Deus, creio que Ele gostaria que eu pintasse o mapa da África com as cores britânicas. (HUMBERMAN, 1986, p.267).

Ambicioso, Rhodes morreu sem que um de seus maiores desejos se realizasse: a construção de uma ferrovia que cortaria a África ao meio, ligando o Cairo à Cidade do Cabo. Porém, seus sonhos expansionistas não se limitavam à África, nem tampouco a este planeta:

O mundo está quase todo parcelado e o que dele resta está sendo dividido, conquistado, colonizado. Penso nas estrelas que vemos à noite, esses vastos mundos que jamais poderemos atingir. Eu anexaria os planetas se pudesse. Entristece-me vê-los tão claramente e ao mesmo tempo tão distantes. (HUMBERMAN, 1986, p.273)

“Mundos que jamais poderemos atingir”. Se o explorador britânico ainda estivesse entre nós, ver-se-ia obrigado a rever seus conceitos com respeito à conquista de outros mundos e, com certeza, ofereceria seus serviços à agência aeroespacial norte-americana.

Quando o primeiro astronauta pisar em Marte e fincar a bandeira dos EUA em seu solo, estará dada a largada para o imperialismo interplanetário. As nações que quiserem pousar no Planeta Vermelho precisarão da permissão estadunidense e deverão pagar pedágio ao Tio Sam, já que estarão em solo americano.

Se cumpridas as sombrias previsões científicas a respeito do futuro de nosso planeta, não haverá clima, literalmente, para aqui sobrevivermos. É permitido supor que os primeiros cargueiros espaciais rumo às colônias marcianas não teriam a bordo aqueles de pés descalços e bolsos vazios. Os primeiros colonos de Marte serão a “nata” terrestre, a mesma elite que hoje pode pagar à empresa Space Adventures um pacote de turismo lunar no valor de US$ 150 milhões - uma ínfima parcela da humanidade. Os demais padeceriam no inferno em que nosso planeta pode se converter, vivendo num ambiente digno do enredo de filmes de ficção científica.

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Referência Bibliográfica


HUBERMAN, Leo. História da Riqueza do Homem. 21 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1986.

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